segunda-feira, 30 de outubro de 2023


 

TIA VIRGINIA

 
Provavelmente escreveria um tratado se fosse abordar como gostaria, a grandeza dessa pérola do cinema nacional.... Baseado nas memórias de infância (do diretor Fabio Fábio), a narrativa nos fala de três irmãs, e se concentra num único dia, onde acontecera a ceia do natal. Virginia vive cuidando da mãe a beira dos 100 anos em estado vegetativo, as outras duas chegam para a ceia e ao longo desse único dia o painel das vidas destas três mulheres é traçado com sabedoria numa narrativa cômica, não fosse tão trágica.... Estão ali todas as diferenças, mágoas, cobranças, escolhas e, sobretudo, os caminhos tomados por cada uma... A casa funciona como um personagem, nela cada elemento guarda uma história,,, Em meio a tantos elementos um relógio na parede dá o ritmo a narrativa e um painel de fotos da família mostra a passagem do tempo... Nas situações apresentadas nada acontece por acaso, nenhuma tomada de elemento de cena, nenhum som ouvido soa de graça... Tudo faz sentido, tem um viés representativo e contribui para o enriquecimento dos diálogos. A atuação da Vera Holtz é irretocável. A propriedade com que transita entre nas várias questões levantadas e seus parceiros de parceiros de cena (relação com a mãe, com as irmãs, os sobrinhos e o cunhado) a torna uma protagonista absoluta. Vera é como se fosse um sol iluminando a todos e sedimentando seus momentos de protagonismo. Não há não encontra uma ou outra identificação com os personagens aqui apresentados.... Quem não tem ou teve uma Tia Virgínia na família???  Quem não viveu, vive ou viverá uma situação limite de um idoso para cuidar?

A narrativa levanta questões reflexivas importantes, ainda que não se atenha por completo a cada uma delas ou se debruce para um maior aprofundamento, nos deixa uma mensagem subliminar forte e necessária... Os diálogos as vezes são precisos e cortantes...

Prestem atenção na atuação da atriz Vera Valdez (a mãe), um espetáculo ... A medida que vai aparecendo (sem emitir um monossílabo sequer) se agiganta com sua expressão e ficamos desconfortáveis, acreditando se tratar de uma idosa doente, de fato...

A trilha sonora do Cesar Camargo Mariano é um luxo, a escolha da canção do Milton Nascimento Um Gosto de Sol coroa o filme com todos os méritos.... Um achado!

O filme foi ovacionado no ultimo Festival de Gramado e premiado: Melhor Filme pelo Júri da Crítica; Melhor Atriz para Vera Holtz; Melhor Roteiro para Fabio Meira; Menção Honrosa do Júri para a atriz Vera Valdez; Melhor Direção de Arte para Ana Mara Abreu; e Melhor Desenho de Som para Ruben Valdés.

Estreia no cinemas dia 9 de novembro.

Ficha Técnica:

TIA VIRGINIA

Direção: Fábio Meira

Roteiro: Fábio Meira

Elenco: Vera Holtz, Arlete Salles, Louise Cardoso, Vera Valdez

Desenho de Som: Ruben Valdés

Trilha Sonora: Cesar Camargo Mariano

sábado, 14 de outubro de 2023


 

QUANTOS DIAS, QUANTAS NOITES

Com direção de Cacau Rhoden (que já nos deu Nunca me Sonharam e Tarja Branca) QUANTOS DIAS, QUANTAS NOITES é mais um acerto deste diretoR que se notabilizou por seu viés reflexivo e questionador. Quando li sobre a proposta do filme, falar sobre nossa relação com tempo, fazer uma reflexão sobre o “envelhecer” e, obviamente algumas questões sobre a morte em meio aos cuidados paliativos, assistência e, sobretudo humanidade, muita humanidade, fiquei curioso e muito tentado... Me permiti e saí da sala querendo gritar para mundo:Assistam a esse filme...”... queria compartilha-lo com o mundo. Documentário tinha a fama de chato, maçante e didático... hoje não mais.... Uma direção acertada e dinâmica transforma qualquer tema num belo e bem-vindo filme.... Como é o caso deste.... Aqui nós temos vários depoimentos, várias estatísticas e, sobretudo várias imagens de profundo impacto.... Envelhecer e morrer se complementam, afinal só vive muito quem envelhece, e quem envelhece um dia morre, como todos nós, afinal, como diz o chavão... é a única certeza que temos na vida;;; Quando? Não sabemos... Mas que iremos, isso sim...

Os depoimentos são de uma profundidade e pertinência pouco vistas... Alexandre Kalache, médico gerontólogo nos faz refletir, Ana Cláudia Quintana Arantes, autora do belo e necessário “A morte é um dia que vale a pena viver” nos fala de cuidados paliativos, uma lição de vida... Sueli Carneiro é de uma lucidez impressionante. Doutora em filosofia da educação, é uma das principais intelectuais brasileiras.... Alguns voluntários e fundadores de movimentos que prestam assistência as favelas e bairros menos assistidos nos fazem parar e pensar além da nossa bolha.... É um filme melancólico, mas não triste.... Algumas situações nos causarão impacto, mas um impacto saudável e necessário. Todos deveriam vê-lo, principalmente os jovens, afinal quanto mais cedo nos prepararmos para a inevitável velhice, mas chances teremos de vive-la em sua plenitude e intensidade, afinal se a morte nos espera, que nos chegue e nos encontre bem... A finitude é crônica para todos, é preciso que façamos o melhor de nós, é de fato a nossa maior riqueza, nosso maior legado.... É preciso que sintamos que nossa existência é válida e de fato vivida, com intensidade...

O filme está sendo exibido com ações de democratização do acesso, com sessões gratuitas de 12 a 18 de outubro.

O filme está em cartaz no Itaú Cinemas de São Paulo e Brasília, o Estação NET do Rio de Janeiro, o Uma Belas Artes de Belo Horizonte e o Cine Glauber Rocha em Salvador.

sexta-feira, 13 de outubro de 2023


 

EXORCISTA – O DEVOTO

 

Alguns filmes já nascem clássicos, esse EXORCISTA – O DEVOTO, já nasce dispensável. Fruto de uma franquia cujo custo com liberação da marca beirou os 400 mil dólares (apenas uso da marca, fora custo do filme),fruto da direção  que já nos deu outra atualização, releitura da franquia do Halloween, outro terror... O Exorcista que nos foi brindado a cinquenta anos atrás foi um marco no cinema, impactou e até hoje ainda impacta... Foram apresentadas duas continuações, que não implacaram, difícil eleger a pior... no entanto esse deve bater com muita vantagem as duas continuações anteriores;;; Ancorado na participação da  Ellen Burstyn (que faz a mãe do original) David Gordon Green nos oferece uma história tosca e que muito fica a dever a proposta original... Coma participação da Burstyn, numa suposta tentativa de oferecer certa credibilidade a narrativa, e que é sumariamente mal aproveitada, a história conta com duas garotas, uma branca e uma negra... estaria ai mais uma ação politicamente correta? Em assim sendo faltariam outras garotas... O roteiro peca em várias situações, inclusive há frases de auto ajuda que envergonhariam qualquer bom roteirista que se preze. O discurso/monólogo sobre o mal soa didático e  desnecessário. O roteiro nos traz a história de duas garotas, como já dito, uma branca e outra preta que saem para um parque na tentativa de invocar o espírito da mãe de uma delas que morrera no parto, situação que ocupa 70% de tempo do roteiro, ficando os 30% do final para o exorcismo propriamente dito... que pasmem, reúne um acervo de crenças... uma freira, um padre, um pastor evangélico e uma negra que evoca ritos afros... Seria uma espécie de exorcismo sincrético??? Isso sem falar nos monitores cardíacos espelhados no quarto ...  que vexame... Os efeitos são bem articulados, apesar de não inovadores. O que legitima mais ainda o filme original, reforçando mais uma vez seu lugar de único e clássico... Fica a questão :  O que esperar das duas continuações, sim, porque a franquia prevê mais dois filmes...

Nos cinemas a partir de 12.10.23

Ficha Técnica:

Título: O EXORCISTA – O DEVOTO

Direção: David Gordon Green

Roteiro: Danny McBride, David Gordon Geen, Peter Sattler e Scott Teems

Elenco: Leslie Odom Jr., Ellen Burstyn, Ann Dowd