domingo, 15 de maio de 2022


 

O HOMEM DO NORTE
O diretor Robert Eggers mostrou a que veio desde A BRUXA, seu primeiro e elogiado projeto e em seguida O FAROL, outra grande obra, uma experiência em preto e branco de profunda dramaticidade, soberba fotografia e atuações sabiamente elogiadas.
Agora nos traz mais essa pérola, um verdadeiro divisor de águas em sua trajetória, projeto de custo das superproduções O HOMEM DO NORTE é uma obra prima sob inúmeros aspectos. Trabalhando com historiadores e arqueólogos, Eggers conseguiu um feito de extremo valor: A tragédia do príncipe traído pelo tio que lhe tira a vida do pai e rouba-lhe o trono e a mãe é de uma densidade e verdade soberba. Determinado o garoto jura vingança pela morte do pai, promete resgate da mãe e morte ao tio. Baseado na tragédia nórdica que inspirou Shakespeare para seu Hamlet, Eggers nos brinda com um FILMAÇO, coroando a trilogia de sua carreira com uma obra que, desde já, é um clássico. Obra de violência extrema , ainda que comedidamente coreografada, não nos pouca de cabeças decepadas, vísceras expostas e sangue, muito sangue. Longe de mais uma daquelas películas sensacionalistas e apeladamente sanguinárias, O HOMEM DO NORTE é muito mais que isso, é uma narrativa genuinamente nórdica, onde o universo ali construído é de um cuidadoso aparato técnico e histórico. Diretor perfeccionista e assumidamente cirúrgico, Eggers controla e se esmera em cada detalhe. Cada espada, cada acessório é construído a risca obedecendo suas reais características com raro primor. Com um roteiro enxuto e dinâmico, uma fotografia de tirar fôlego, elenco de primeiríssima linha e trilha sonora arrebatadora, O HOMEM DO NORTE consegue ser um filme perturbador, dá voz a mulher, fala da violência, do esporte e, ainda que seu mote seja a atormentada vida de um homem movido pelo desejo de vingança consegue encontrar espaço para falar de encontro, amor e, sobretudo redenção. A história é forte e, longe de ser mero entretenimento, ainda que de extrema violência, característica inegável da época, é de uma beleza pouco vista. Há cenas de viés alucinógeno, bruxaria, uma viagem de rara beleza no inconsciente, nas trilhas da imaginação. Há tomadas de cair o queixo!
Alexander Skarsgard (A Lenda de Tarzan) é um monstro em cena, compõe um Amleth com maestria. A vida atormentada do homem desprovido de afeto e movido pela sede vingança é de uma visceralidade eminentemente singular. Sua conexão estabelecida no encontro com Anya Taylor-Joy(Cambito da Rainha e A Bruxa) é de uma sintonia imediata e, em meio a toda selvageria resgata o sentimento e afetuosidade que apenas nutria pelo pai, morto a sua frente. Nicole Kidman (faz Gudrún, a rainha mãe) dá um show, há cenas que consegue roubar a atenção com frases simples e cortantes, fruto de uma direção pontual e certeira. Sua presença é imponentemente marcante.
Como se não bastasse a rotina violenta, o diretor ainda encontra tempo para o misticismo e uma boa dose de viagem, imaginária, numa espécie de sensação alucinógena que produz imagens de rara beleza fazendo equilíbrio com a violenta selvageria dos confrontos tão comuns à época. Bjork faz uma pequena, mas intensa participação ostentando um figurino carregado de simbologia, coisa que só os cuidadosos e grandes diretores são capazes de imaginar e conceber. As cenas no mar são de uma angustia e uma melancolia que nos levam ao extremo do desconforto, as tomadas no escuro, a lama, a paleta de cores acinzentada dão um toque de tensão necessários a narrativa. Um misto, portanto, de selvageria, misticismo e bruxaria num caldeirão que só se mostra equilibrado em mão competentes e talentosas como as do diretor. Um filme grande para se ver em tela grande, com som poderoso e atenção redobrada. Impossível se sair da sala sem um certo desconforto, mas como uma sensação de deslumbramento e de questionamentos diversos... Quando a violência, a selvageria e até mesmo a superexposição das agruras nos invade os mistérios da alma, a sensação que nos fica em meio ao cansaço é de êxtase e questionamento. A experiência sensorial que o filme nos provoca é de uma necessidade extrema, é o cinema que volta a seu propósito inicial que é instigar, fazer pensar, refletir e não apenas entreter... Temos ai um grande e talentoso diretor que desponta com três grandes obras de equilibrado e reconhecido valor, o que não é pouco em meio a falta de personalidade e viés autoral da maioria dos diretores da atualidade muito mais preocupados com retorno financeiro que com obra de fato, capaz de, avassaladoramente nos tomar e nos fazer abstrair e viajar nas duas horas que passam quase que despercebidas... Mérito para poucos.
Em cartaz nos cinemas.
Ficha Técnica:
Título Original: The Northman
Duração: 137 minutos
Ano produção: 2021
Distribuidora: Universal Pictures
Direção: Robert Eggers
Elenco: Alexander Skarsgård, Nicole Kidman, Claes Bang, Ethan Hawke, Anya Taylor-Joy, Gustav Lindh, Willem Dafoe
Classificação: 18 anos

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