sexta-feira, 18 de março de 2022


 

DRIVE MY CAR

Ryusuke Hamaguchi voava para Berlim quando recebeu a notícia das quatro indicações ao OSCAR do seu aclamado e premiado filme, no festival de Cannes, DRIVE MY CAR, uma surpresa nos ares.... Baseado no conto homônimo de Haruki Murakami,  DRIVE é um daqueles filmes que ao término nos deixam paralisados, o poder de nos instigar é igualmente avassalador com o conteúdo que nos brinda e nos faz questionar a vida. A narrativa nos fala de um diretor de teatro em meio aos ensaios da peça TIO VÂNIA, do russo Anton Tchékhov, que vive um casamento abalado pelo luto da perda filha e a sabida mas não admitida traição da mulher. Esse apenas o ponto inicial da narrativa que nos reserva muitas revelações futuras.... Com a inesperada morte da mulher segue para um festival na cidade de Hiroshima onde montará a peça. Lá uma jovem motorista designada pela organização do festival onde a peça será encenada,  mudará os rumos da sua vida... Reticente e radical no primeiro momento, não aceita a motorista, aliás uma antipatia mútua... A guinada do filme vem quando os ensaios para a peça iniciam, inclusive com a técnica inusitada usada pelo diretor e a motorista assume o posto. Ficamos aqui para evitar spoilers... Com sabedoria Hamaguchi faz uma mistura do texto do espetáculo teatral (Tio Vânia), do conto (DRIVE MY CAR) e nos brinda com um filme que,  apesar dos 180 minutos de duração, é um achado e seus minutos passam imperceptíveis, afinal quando o conteúdo existe e de fato aflora, o tempo voa. Com um mixto de silêncios e muito papo, DRIVE conta com um elenco multinacional, cada ator fala na sua própria língua (inglês, mandarim,  e coreano) além de uma muda que atua se expressando na linguagem de sinais coreana. Com um viés completamente intimista o roteiro ainda nos surpreende com revelações ao longo da narrativa. A medida que a relação gélida entre o diretor e a motorista evolui, vamos recebendo sinais que apontam essa evolução. Vale citar a cena em que fumam juntos no carro (coisa que o diretor educadamente proibia). É poética e muito significativa as mãos ao vento e a cumplicidade ali selada, assim como a cena em que o diretor passa para o banco da frente do carro, dois momentos emblemáticos e determinantes da narrativa. Ali é o marco da mudança e da aliança que se mostra a seguir... O toca fitas ligado onde a repetição do texto de Tio Vânia era constantemente ouvido durante as viagens é logo substituído pelo cumplicidade e troca de visões de mundo em forma de confissões e tormentos...Outra curiosidade e grande acerto são as cenas gravadas dentro do carro. O filme acontece quase que em sua totalidade dentro do carro ( um Saab vintage vermelho que se tornou marca emblemática do filma, de um apelo visual super acertado, assim como o toca-disco de vinil, um luxo), um ambiente fechado que convida a aproximação, a cumplicidade e intimidade. A opção do festival ocorrer na cidade de  Hiroshima é outro sinal da valiosa simbologia do filme (talvez como uma espécie de analogia a destruição como capacidade humana, vide seu histórico). Nas poucas cenas em que podemos contar com uma inusitada fotografia externa, uma vez praticamente rodado dentro do carro, onde vemos um pouco da cidade em meio ao percurso do carro, outra curiosidade: É solicitado pelo diretor que o hotel em que ficar hospedado fique distante do teatro dos ensaios para que o tempo gasto no percurso lhe permita ouvir/ensaiar o texto. No mínimo um fato curioso e simbólico. É um filme que em seus 180 minutos cresce de maneira absurda, nos envolvendo e nos fazendo cúmplices, além da homenagem explicita (através do teatro) é reconfortante saber do poder da arte e sua importância na vida enquanto respiro. Gastaria laudas a falar dos méritos de DRIVE e seu impacto sobre mim... algo bastante pessoal que, empaticamente desejo que contamine a todos que o virem. Num momento em que vivemos uma total correria, numa busca desenfreada por algo que as vezes nem mesmo sabemos o que, é reconfortante ver uma discussão sobre a vida, os mistérios, os segredos, as dúvidas, as culpas, as incertezas e, principalmente, o saber amar...

Os últimos momentos num palco são de uma beleza em forma de simplicidade e emoção de raro valor.

Ficha Técnica:

Título Original: Doraibu mai Kâ

Direção: Ryusuke Hamaguchu

Roteiro: Ryusuke Hamaguchi e Takamasa

Elenco: hidetoshi Nishiji,a, Toko Miura, Masaki Okada

Música:  Eiko Ishibashi

 

 

 

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