quinta-feira, 14 de novembro de 2024


 

GLADIADOR 2

A sequência do épico do Ridley Scott é projeto de anos... uma espécie de retomada de um sonho que só agora em meio a muitos avanços tecnológicos foi possível realizar...  Seus filmes são grandiosos, caros, super produzidos.... Seus objetivos são nobres e, do alto de seus 80 e poucos anos, vamos combinar, pode se dar ao luxo sim... Mexer numa produção cultuada, premiada e super aguardada é tarefa para mestres e neste caso, em meio a todos os problemas que lhe renderam atrasos fenomenais e aumento de praticamente o dobro no orçamento, não é tarefa para fracos, e creio, ainda que com algumas considerações ele a executou com louvor... O roteiro versa sobre o adulto que o herdeiro do Maximus, o pequeno Lucius se tornou e sua luta para transformar uma Roma descaída, movida a corrupção, vaidades, luta pelo poder e muito sangue... Contando agora com dois jovens talentos Paul Mescal(Aftersun, Todos Nós Desconhecidos) e Pedro Pascal, que não fazem feio, aliás um é coadjuvante de luxo, o elenco ainda conta com a participação luxuosa de Denzel Washington, que como reza a cartilha, é mais um antagonista que rouba a cena e nos brinda com uma de suas melhores atuações, um primor... Cumpre-nos citar que o melhor de GLADIADOR 2 é o GLADIADOR, sim, porque o roteiro basicamente nos traz a continuação edificado em flashbacks que, além de surtirem um efeito nostálgico dão um pouco de dramaticidade neste segundo que centrou a mão nos embates construídos com muita pancadaria, ai inclusas as decapitações regadas a muito sangue... afinal é uma narrativa de gladiadores... É tudo muito grande e bem construído, o prólogo é de uma riqueza singular, uma espécie de aviso de preparação para o que vem a seguir... O ponto fraco do roteiro são as varias abordagens(e são muitas) sem um desenvolvimento a contento, o que esvazia a dramaticidade e solta foco apenas na ação, que aliás o filme tem de sobra... Não contente em realizar o sonho (abortado no Gladiador 1) de levar um rinoceronte para o coliseu, que aqui concretiza, Scott ainda leva o mar de tubarões, uma. Desde já cena clássica... E que, os fiscais de plantão não se arvorem... há indícios de que agua também era levada para os jogos no Coliseu, ou seja, não se trata de delírio de diretor... Não contente apenas com as cenas, Scott também resgate um dos maiores acertos do Gladiador1, sua trilha sonora, e mais especificadamente a canção que povoa o imaginário dos amantes da sétima arte até hoje,  Now we are free, um dos pontos altos das duas narrativas... Certamente será uma das grandes bilheterias do ano, o que já nos da a nítida impressão de que um GLADIADOR# é certamente mais uma meta do diretor... Gosto da abertura com os créditos fazendo uma espécie de resumo do Gladiador 1, um achado que além de funcional guarda uma rara beleza... Como se não bastasse tidos os méritos, o filme ai conseguiu invadir os tabloides com a polemica do beijo gay cortado, uma observação feita inclusive pelo Washington, que afirma, ainda que não sendo um beijo romântico, existiu e foi cortado pelo estúdio... Inacreditável como um beijo entre homens ainda cause tamanho rebuliço... Scott é um dos poucos diretores que ainda conseguem realizar projetos autorais equilibrando suas expectativas com a expectativa comercial que nem sempre se afinam, modernizando elenco, tomando liberdades poéticas e sobretudo, conseguindo corresponder aos cofres dos estúdios. Vejam GLADIDOR2, uma experiência super válida onde atuações, direção e sobretudo projeto como um todo não faz descaso com o expectador e lhe entrega o que promete: Um grande filme!

Em cartaz nos cinemas!

 

Ficha Técnica:

Título: GLADIADOR 21

Direção ; Ridley Scott

Roteiro: David Scarpa e Peter Craig

Elenco: Denzel Washington. Paul Mescal, Pedro Pascal, Connie Nielsen

terça-feira, 22 de outubro de 2024


O QUARTO AO LADO

Decididamente Pedro Almodóvar amadureceu, caminhando para suas oito décadas de existência. Amadureceu lindamente sem perder sua essência, sem perder as características singulares que o fizeram o maior cineasta espanhol de sua geração e o reverberaram para o mundo... O QUARTO... é a prova cabal disso.... Estão lá muitos dos seus temas, seus elementos, suas inquietudes. Com elenco enxuto e estrelar, a narrativa nos fala do recorte de vida de duas amigas, uma delas com câncer terminal, motivo de reencontro anos depois de uma convivência e a experiência de conviver com a aproximação da morte. Cansada dos tratamentos que prometem uma cura cada vez mais difícil Martha (Tilda Swinton, um colosso) resolve desistir e abraçar a morte, precisando, portanto, do auxílio da amiga Ingrid (Julianne Moore, incorrigível atuação). Após o reencontro passam a conviver aguardando a hora da partida...  E é exatamente esses momentos de convivência que antecedem o grande dia da partida que o filme se sustenta nos brindando com momentos de rara beleza onde um manancial de temas são explorados de maneira casual e natural... Aqui há momentos de se falar da finitude, da confusa rota da humanidade em meio a uma possível colisão com o inevitável caos, politica, arte, amizade e cinema, que em belas cenas recebe uma poética homenagem... Emoldurada com uma trilha bacana, a narrativa é construído num cenário de rara beleza onde as famosas cores quentes, marca registrada do Almodóvar, aqui agora são de um equilíbrio e de um estilo pouco visto na cinematografia atual. Seus elementos de cena fazem parte da cena como se fossem personagens, gritam aos olhos e contribuem de maneira exemplar para o enriquecimento de cada mensagem, de cada momento poético e edificador. Martha aluga uma casa, muda-se em companhia de Ingrid para lá passarem os últimos momentos... A arquitetura da casa é detalhe a parte e só agrega a narrativa...A morte aqui, mola propulsora da narrativa, é vista e questionada de forma leve e sutil... Há uma certa apreensão por conta dos ganchos e pequenos detalhes que o mestre constrói que tornam a evolução para o esperado final mais bem costurado e equilibrado, onde pouco de fala e muito se observa na sutileza de seus recados. A atuação do trio de atores, aqui incluso o John Turturo é de uma beleza e grandeza singular. Primeira experiência com produção em língua inglesa, e, lastreado em sua experiência na direção de atores americanos, ainda que em produções não inglesas, a direção é primorosa e faz desta, uma grande e acertada estreia. Fugindo das armadilhas que poderiam prontamente se estabelecerem, a síntese desta pequena e valioso pérola não cai no dramalhão rasgado como geralmente o fazem filmes cuja morte eminente é tema central.... Aqui os questionamentos são profundos e leves, por vezes até com sutil humor. A química entre as duas atrizes é um achado: uma é escritora e teme a morte, exorcizando este medo através de seus livros, a outra é jornalista, correspondente de guerra e viveu momentos no limiar dos confrontos tendo a morte como previsível final... uma ironia que se torna um desafio pautada no equilibro e conscientização... São duas mulheres com suas histórias de vida que, através de uma bela e verdadeira amizade, se reencontram, se reconectam e se completam... A decisão de Martha em pôr fim ao seu sofrimento e a necessidade de um suporte para que não esteja sozinha neste momento cria através dessa premissa uma oportunidade para que as duas juntas revejam suas vidas, seus valores e, sobretudo, suas crenças e conceitos... Proibida no EUA, a eutanásia é, e sempre foi motivo de acalorada polemica, no entanto aqui não é condição, não é prioridade... Alguns podem achar que os temas abordados de ambas as vidas dos personagens já foram abordados a exaustão, cumpre no entanto lembrar; talvez sem a beleza, a poesia e a sensibilidade como aqui é feito, através do talento e carisma da dupla que encontra em sua química o equilíbrio perfeito que nos emociona, e nos inquieta sem no entanto cair no clichê da auto ajuda... Um feito.

Premiado, incensado e comentado, O QUARTO... já chega mostrando sua capacidade de impacto. Baseado no livro O QUE VOCÊ ESTÁ ENFRENTANDO, de Sigrid Nunez, com roteiro adaptado do próprio Almodóvar, foi o vencedor do festival de Veneza e promete causar nas demais premiações culminando certamente com várias indicações ao Oscar, prêmio máximo e esperado pela legião de cinéfilos, o que diante mão já se mostra um impasse: a atuação das duas atrizes se equilibram, ambas possuem mesmo tempo t em cena...E agora? Duas protagonistas.... Assistir O QUARTO... é experiência obrigatória aos amantes da sétima arte, uma vez que aqui encontramos um exemplo genuíno das boas construções, do cinema belo e bem realizado, de atuações irretocáveis e, sobretudo de um Almodóvar maduro e deliciosamente inteligente, aliás, como de costume.

Nos cinemas a partir de 24 de outubro.

Ficha Técnica:

Título: O QUARTO AO LADO

Direção e Roteiro: Pedro Almodóvar

Elenco: Julianne Moore, Tilda Swinton, John Turturro

 

 

 

 

quinta-feira, 3 de outubro de 2024


CORINGA - Delírio a Dois

Cresci mergulhado e maravilhado com o universo dos quadrinhos, e, em meio a Turma da Mônica e O Universo dos Super Heróis … Sendo que neste último, Barman e Super-Homem tinham cadeira cativa, sedimentei minhas grandes referências cinematográficas … CORINGA , um dos ou senão o mais fascinante dos vilões do universo do Batman sempre me chamou atenção … O Coringa do Heath Ledger fez história, foi um divisor de águas na personificação dos vilões … assim como o do Joaquin Phoenix de 2019… Eis que agora nos chega o CORINGA - Delírio a Dois , uma superprodução que quadruplicou de orçamento e ousou na junção de drama e musical … vamos combinar, uma ousadia muito próxima de um possível tiro no pé … o que, por pouco não aconteceu … A trajetória do Coringa, agora preso e aguardando julgamento, é dramática, pesada e, continua numa sucessão de abusos sofridos … Traçar essa narrativa em meio a números musicais é tarefa hercúlea … para poucos … Não convém aqui falar mais detalhadamente da sinopse sob pena de incorrer em MUITOS spoilers… Se faz necessário o impacto da surpresa, ainda que o pouco material divulgado fatalmente nos induza a uma possível narrativa que, pode ser de fato, não a verdadeira do filme … Ficamos aqui …
Joaquim Phoenix continua um monstro na atuação … nos entrega um CORINGA visceral e, pasmem ainda mais completo … um absurdo de atuação que só grandes atores dão conta … Lady Gaga, pode não estar num bom momento mas, nos brinda com bons números musicais, no entanto, honestamente, está a Kms luz distante da visceralidade do Phoenix e não deixa de ficar meio solta, sem função… Os números musicais puxam a dramaticidade pra baixo em alguns momentos … tornam a narrativa mais comprida do que de fato deveria ser e lhe rouba o potencial dramático … o que poderia ser evitado com um corte de 20 minutos … decididamente não faria falta alguma … A ideia da continuação (neste caso ) procede e é até pertinente, apesar de que, o que vemos aqui é um Coringa vivendo(ainda) os abusos, meio que conformado e menos ou não violento, de certa mais do mesmo … Com fotografia soturna, trilha mediana e roteiro meio amarrado e totalmente entregue a cenas internas, fica nos devendo o deslumbre das cenas de ação e, principalmente dos delírios do Coringa… sua marca registrada … Acabou vkirando mais um filme de tribunal... Mas, ainda assim não deve deixar de ser visto !
Vale destacar que as músicas são verdadeiras pérolas desde a década de 70 a 90… puro deleite para bons ouvidos … uma versão de Né Me Quitte Pas com Joaquim ao telefone é bem bacana, um primor .
Nos cinemas a partir de 3 de outubro !


Ficha Técnica:
Título : CORINGA Delírio a Dois
Direção : Todd Phillips
Roteiro : Scott Silver e Todd Phillips
Elenco : Joaquin Phoenix, Lady Gaga

domingo, 22 de setembro de 2024


 

AINDA ESTOU AQUI

 

Adaptação do livro homônimo autobiográfico do Marcelo Rubens  Paiva, filho do Rubens Paiva que é sequestrado e dado como desaparecido pela ditadura militar brasileira na década de setenta. A narrativa centra foco em Eunice Paiva, mãe de Marcelo que, a época dona de casa, assume a criação dos filhos sozinha e inicia a luta em busca das explicações acerca do desaparecimento do marido. Nesta trajetória se reinventa, volta a estudar, e como advogada passa a ser ativista nas questões dos direitos humanos. Marcelo Rubens Paiva, já conhecido pelo seu livro Feliz Ano Velho, também autobiográfico, onde relata o acidente que sofreu aos 20 anos e o deixou tetraplégico. Completando pouco mais que 40 anos, o livro foi adaptado para cinema e para teatro, o que deve acontecer com esse seu Ainda Estou aqui, que logo deve subir aos palcos.

Walter Salles é amigo pessoal da família Paiva, o que poderia lhe render ganhos nessa empreitada e, obviamente a depender de sua condução lhe trazer também dor de cabeça... saltou essa fogueira com louvor e nos brinda com um filme magnifico. Arriscaria a dizer até que esse é seu momento de amadurecimento após nos ter oferecido grandes sucessos como Central do Brasil (inesquecível) e Abril Despedaçado (Outra obra prima na humilde opinião deste que vos escreve). A adaptação feita por Walter para o filme faz um prólogo onde por cerca de meia hora nos traz um painel da vida e da relação do Rubens com a mulher, os filhos e os amigos... O pai doce e dedicado, marido amoroso e apaixonado e o amigo leal e afetuoso... uma forma de mostrar um pouco de quem foi esse homem nos poucos dias antes de ser sequestrado e executado pela ditadura. Não tive a oportunidade de ler o livro do Marcelo para estabelecer algumas opiniões acerca da adaptação, o que de certa forma julgo até desnecessário, quero lê-lo porque tenho certeza, será mais rico em situaçóes e detalhes impossíveis de serem acondicionados em duas horas de projeção...

Com uma direção sensível, mais nem por isso menos enfática e pontual, Salles nos mostra nas primeiras cenas um painel sócio-político-cultural da época. Estão lá o vendedor de mate com limão e seu indefectível uniforme verde Brasil, o habito indefectível de se bronzear com Coca-Cola, as músicas e os hábitos da época (quem ainda lembra de suflê???) .... Passada essa introdução idílica recebemos a porrada que foi o sequestro do Rubens. A partir daí vivemos o calvário da Eunice em meio a sua detenção, sim ela também foi presa para depoimentos, busca por explicações pelo sumiço do marido e a criação dos filhos.

A reconstituição de época é perfeita, em cada mínimo detalhe percebemos o excesso de cuidado e principalmente a excelência em sua legitimidade. A fotografia é exemplar, a maior parte das cenas são em ambientes fechados e a luz faz toda numa diferença ( as cenas finais são um assombro de belas... uma nostalgia a parte... a casa), principalmente na atuação dos atores que vai além dos protagonistas, aqui irretocáveis, um time de feras que atuam como coadjuvantes de luxo, o que contribui para o equilíbrio e a grandiosidade do filme...Aqui todos estão bem, aí levemos em consideração, até a presença minimalista da |Fernanda Montenegro que, sem spoiler, rouba a a cena... Cumpre-nos legitimar a soberba atuação da Fernanda Torres, aclamada em Veneza(veja os depoimentos de críticos nos principais jornais do mundo). Atriz mais conhecida por aqui por suas atuações cômicas, nos oferece uma Eunice de viés dramático equilibrado e cativante, sem em nenhum momento cair no drama rasgado (uma armadilha possível) e exagerado... Fernandinha nos brinda com uma Eunice forte, determinada, a frente de seu tempo, uma mãe zelosa e esposa dedicada que, apesar das atribuições do lar ressurge em meio a fatalidade com força e determinação. Um fato interessante, digno dos grandes mestres, Salles, através de pequenos detalhes em cena (tipo, um livro, um vinil, um quadro, um eletrodoméstico) faz, sem palavras um painel da época, um alerta político, um tributo... Coisa de gênio. Um filme necessário que nos resgata um pouco da história, por alguns esquecida... Uma forma de declarar amor aqueles que sofreram e sofrem pelos seus mortos ou desaparecidos... Um lição de rara beleza.

O filme teve estreia em Salvador última quinta e permanece até dia 26.09 em cartaz, objetivando qualificação para representar o Brasil na tentativa de uma possível indicação ao Oscar de melhor filme Internacional.

Ficha Técnica:

Titulo: AINDA ESTOU AQUI

Direção: Walter Salles

Roteiro: Murilo Hauser

Elenco: Fernanda Torres, Selton Mello, Humberto Carrão, Marjorie Estiano, Maeve Jinkings, Daniel Dantas, Dan Stulbach

Designer de Produção: Carlos Conti